domingo, 31 de maio de 2009

Engano.

Tempos houve em que pensei a minha escrita como um desabafo.
Apercebo-me agora... Escrevo por sentir-me demasiado cansada para falar.

sexta-feira, 29 de maio de 2009

A estranha em mim.

Tic tac, tic tac... Assim decorrem os dias. Sempre iguais, monótonos, rotineiros, como eu gosto. Tento lembrar acontecimentos, mas aquilo que me chega é difuso. Não mais são que fragmentos de imagens desordenadas, tremidas e distantes, embutidas em tela preta, de uma vida que nem sei ser minha. Olhando para elas, não me vejo. Não sei se seria outra pessoa que agora não sou, se me imagino agora de outra forma e o meu eu ficou para atrás. Tic tac, Tic tac... Compassado, ausente de flutuações, quase que me embala o corpo cansado e dorido. Sentir esta mutação constante, esta existência alienada, esgota-me. Tic tac, tic tac... Por momentos desejo-me assim, sem oscilações, como o relógio que bate sempre na mesma cadência e, salvo alguma falha humana, não erra. Tic tac, tic tac... Encosto-o de encontro ao ouvido e deixo-me adormecer. Já não sei de mim. Se ao menos eu fosse minha... Sinto-me uma estranha em casa.
No dia seguinte, o cão do vizinho ladra. Não me reconhece.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Palavras vs Silêncios.

As palavras mais cruéis encerram-se entre paredes invisíveis feitas de silêncios. Nunca chegarão a ser. Palavras, portanto. Se chegassem a ser palavras, deixariam de ser cruéis. Seriam apenas isso. Palavras.

Sons & Palavras.

Broken
"He's got a broken voice and a twisted smile
Guess he's been that way for quite awhile
Got blood on his shoes and mud on his brim
Did he do it to himself or was it done to him?

People think he don't look well
But all he needs from what I can tell
Is someone to help wash away all the paint
From his purple hands before it gets too late

I saw him stand alone, under a broke street light
So sincere, singing silent night
But the trees were full, and the grass was green
It was the sweetest thing I had ever seen

He may move slow
But that don't mean he's going nowhere
He may be moving slow
But that don't mean he's going nowhere"

quarta-feira, 27 de maio de 2009

As palavras que te envio são interditas.

"As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.

Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.

E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas."
Eugénio de Andrade

Carta fechada.

Chorei. Não foi um choro em que os soluços saem da alma em espasmos. Foi um choro silencioso. Soube-me a tristeza. Resignei-me à minha condição terrena. Senti-me impotente. Apercebi-me que, por mais que avance, o amanhã permanece sempre inalcancável. A realidade, a dura realidade, é que ele anda sempre dois passos à minha frente. O ontem não me atormenta. Posso visitá-lo sempre que quiser, em pensamentos feitos de memórias mais ou menos desfocadas. O hoje não me atormenta. Posso fazer dele o que quiser. O que me atormenta mesmo é o amanhã. É esse dia que nunca chega e se me apresenta como uma carta fechada. É o não saber... É o saber que agora não estás. Hoje chorei até me doerem os olhos e sentir que já nada poderia sair de mim. Nem palavras. Apenas água salgada. Talvez um dia. Ou amanhã...

terça-feira, 26 de maio de 2009

Hoje acordei especialmente contente.


Hoje acordei contente. Minto. Hoje acordei especialmente contente. Só contente, acordo muitos dias...
É bom. Acordar sem o barulho irritante do despertador, com os lençóis mudados de véspera ainda a cheirar a fresco. O chilrear dos pássaros. A ausência do barulho do trânsito. A luz do sol reflectida no cortinado vermelho. É bom. Espreguiço-me por segundos lânguidos. Levanto-me e olho o espelho. Hum... Dormi pouco, é verdade. Esta ansiedade, vinda sei lá eu de onde, impediu-me de adormecer cedo. Mas não tenho olheiras e sorrio para o meu reflexo.
Hoje acordei especialmente contente.
Tomo um banho morno, desço as escadas para a cozinha e preparo um café. Grande, cheio, daqueles que só bebo em casa. A minha bichana parece adivinhar o meu estado de espírito. Roça-se levemente nas minhas pernas à espera de mimo. Dou sempre. Acendo um cigarro e levo a caneca comigo. Gosto deste cheiro. Os primeiros indícios de calor guardaram as meias de lã na gaveta, devolveram-me a vontade de andar descalça pela casa e sentir o soalho frio nos pés.
Hoje acordei especialmente contente. Já tinha dito, não?
Sinto-me novamente uma menina pequena. Vou sê-la. Volto a carregar os livros na sacola cor-de-laranja, quase do meu tamanho, que a minha mãe me fez. Apesar de ainda não conseguir lê-los nunca os deixo, andam sempre comigo. Isso e as canetas de todas as cores e mais algumas. Descubro as palavras em folhas usadas que já foram brancas. Tento decifrar a forma como se desenham. Aprendo as vogais. E acredito, ingenuamente, que conseguirei ensinar o meu vizinho analfabeto a ler. Hoje sou aquela menina que chega a casa com os joelhos esfolados e o vestido sujo, depois de andar a jogar à bola com os outros meninos. Volto a comer pão com Tulicreme e Nutella às colheradas. Ou Nestum de mel, directamente do pacote. Salto e corro, rebolo na erva. Tento agarrar boboletas coloridas. Vou para as ribeiras, que por esta altura vão secas, apanho pedrinhas lisas e de forma arredondada. Salto e corro. Salto e corro... O meu cão d´água salta à minha volta, entre latidos de satisfação. Salto e corro. Salto e corro... Caio. Mas não importa. Chego, uma vez mais, com o vestido sujo a casa. A minha mãe ralha comigo por ser tão maria rapaz. Mas não importa. Amanhã faço o mesmo.
Hoje acordei especialmente contente. Não sei explicar a razão. Tenho a alma cheia de alegria. A alegria pueril de quem não se importa. De quem não tem medo ou receios. A alegria de quem, por mais anos que passem, continua a acreditar. Salto e corro. Salto e corro...
Hoje vou fazer bolos pequeninos de chocolate. Amanhã regressas...

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Dás-me vontade.


Em bicos de pés. Os meus braços em redor do teu pescoço. Os teus braços em torno da minha cintura. Um abraço apertado. Levantas-me e eu sinto-me uma pena. Fecho os olhos. Rodopiamos ao som da música feita do bater dos corações e de risos. Sinto-me tonta mas deixo-me ir... Aperto-te com mais força. Nada digo. Sei que sorris para mim. Não sinto os pés no chão...

domingo, 24 de maio de 2009

Esperança.

Hoje acordei e pensei.... Preciso matar esta angustiante esperança de não ser apenas uma sombra de mim. Ter um momento de certeza. Qualquer que seja... Quero ser luz.

sábado, 16 de maio de 2009

Amo-te.

Amo-te.
Sempre estiveste além do teu tempo, além do espaço onde nasceste e viveste. Hoje os dias passam por ti, consomem-te a pele, a carne e os ossos e fazem-te envelhecer. Amo-te... Não sabes cantar, de trás para a frente, o nascer e desaguar dos rios, não conheces as dinastias, não recitas poesias, não sabes a tabuada e, na verdade, mal sabes ler e escrever.... Mas sabes... Sabes as coisas mais importantes e valiosas que nenhuma escola ensinou até hoje. És feita de trabalho árduo, de dias passados ao sol e à chuva, cheiras a terra molhada e a maresia. Amo-te... Sempre te ouvi atentamente, sempre deixei que as tuas palavras me percorressem a mente e o coração, mesmo que depois acabassem por cair no vazio. Sempre foste paciente, com a tua voz doce e meiga, como um leve bafejar no pescoço. Nunca te vi alterada ou fora de ti. Acho que, por tudo o que viveste até hoje, tens a força de um cavalo indomável. Tens essa mesma força, porém invísivel, que fica resguardada no teu corpo outrora ágil e que agora se tornou trôpego e rendido ao tempo. Já não andas a meu lado, não mais me acompanhas em longas caminhadas estrada fora, mas acompanhas-me na vida. Acompanharás, sempre. Amo-te... Nunca tentaste desviar-me do meu caminho, nunca quiseste interferir nas minhas escolhas, porque sabes e conheces a liberdade. Conheces a teimosia que nasceu comigo, sabes que ouvi e continuo a ouvir-te em mim, que valorizo tudo o que a vida te ensinou e me transmites. Mas sabes, também, que a última palavra sempre foi a minha. Que mesmo tendo consciência de que ia errar... preferia fazê-lo a ficar na dúvida. É por isto tudo, e além de tudo isto que te amo. Nunca me prendeste, nunca me julgaste, sempre conseguiste criticar-me de uma forma tão carinhosa que sempre consegui aceitar qualquer crítica construtiva vinda de ti.
Se soubesses o quanto te amo... Amo os teus olhos meigos, o olhar de quem já viveu tanto e mesmo assim permanece impávida e serena a qualquer dissabor. Amo a tua voz, hoje trémula, mas que ainda preserva a mesma suavidade de antes...
Ainda me lembro da primeira vez que chorei no teu colo. Era uma tarde de Verão como outra qualquer. Hoje já não a lembro como uma tarde comum. Recordo-a com extrema nitidez. Tinhas me comprado um balão daqueles que se vendem nas feiras. Dos balões, uns de uma forma outros de outra, de todos eles, escolhi um coelho amarelo. Vinha felicíssima com o balão a caminho de casa, não fosse eu uma crianca igual a tantas outras, alegre e despreocupada, alheia a qualquer tristeza. Numa das mãos, o balão preso a um fino fio de nylon que enrolei entre os dedos, na outra mão, a tua. "Não soltes o fio porque, se o soltares, o balão foge.", dizias tu. Mas isso nem me passava pela cabeca.... O balão tinha sido comprado por ti, para mim, era meu, e como era meu, não poderia fugir-me.
Mas quando cheguei à porta da tua casa o impensável aconteceu...
Eu olhava o balão suspenso pelo fio de nylon, mas queria senti-lo nas mãos, conhecer a sua textura, saber de que era feito. Por isso, puxei o fio suavemente, e com a outra mão encostei-o contra o peito, desprendendo-o fio que trazia enrolado nos dedos. Finalmente segurei o balão com as duas mãos, pequenas e com poucos reflexos, para poder vê lo melhor. Precisava descobrir o que seria afinal aquela enorme bola com duas orelhas, que me intrigava, pois não caía e aparentemente não tinha peso algum. E então, sem saber como, o balão fugiu-me... Foram apenas uns segundos. Uns breves segundos...
Não tive qualquer reacção. Quando olhei para o céu semicerrei os olhos, só vi a forca bruta do sol e o balão que subia cada vez mais alto, tornando-se mais pequeno até se perder na imensidão azul.
Senti os olhos humedecerem, mas nada disse. E tu olhaste-me. Na minha garganta formou-se um nó que parecia querer impedir-me de respirar. Abri os olhos o mais que pude, sentia-os a arder, inundados por uma água quente. Até que deles rolaram duas lágrimas que vieram parar-me na boca. Eram salgadas. Mesmo assim nada disseste. E eu continuei calada. Sentaste-te no banquinho de madeira que ainda hoje permanece no mesmo sítio, agarraste em mim e puxaste-me para o teu colo. Aconchegaste-me bem junto a ti e só aí, com a cabeça enterrada no teu pescoço, solucei. Tinha deixado fugir o balão que me tinhas dado....
E, nesse preciso momento, soube que tinha melhor colo do que algum dia seria capaz de sonhar.
14 de Maio de 2009

terça-feira, 12 de maio de 2009

Sinto-me...

Não sei que horas serão. Caminho sem pressa, apenas pelo prazer de sentir o movimento do corpo que parece cortar o ar por onde passa. Páro e olho para trás. A aldeia está mais distante, mas continuo no meu caminho, o caminho que vou fazendo à medida que vou andando. Não sei durante quanto mais tempo ando, de um lado e de outro uma paisagem verdejante e, quase escondida pela vegetação, vejo a água que desce pela montanha enquanto se vai estreitando até terminar num fio de água quase imperceptível. Não fosse a fonte de aspecto grosseiro na qual a água cai, pacientemente, a conta gotas, pareceria que nunca ninguém ali havia estado. Uma pequeno rochedo talhado pela natureza impõem-se timidamente ao lado da tosca fonte. Já devem ter passado por ele muitos anos, mais do que aqueles que consigo contar e ele deve ter-se habituado às visitas à fonte, porque ganhou a forma de um assento. Quantos antes de mim terão passado aqui? Quantos terão descansado nesta sombra? Sento-me. Não tenho urgência de chegar a qualquer lado. Inclino-me sobre a fonte e tenho que juntar as mãos em forma de concha para conseguir beber a escassa água fresca que consegui segurar nas mãos. Daqui consigo ver a aldeia ao longe. As casas espalhadas de forma desordenada pela encosta parecem fazer todo o sentido. Não poderiam estar de outra forma. Aqui e ali, saindo de uma ou outra chaminé, vejo o fumo que se vai desfazendo de encontro ao céu. O sol apareceu sem vergonha e o vento quase nem se sente. Até as árvores lhe são indiferentes. Permanecem impávidas perante o seu sopro. Apenas algumas nuvens se arrastam vagarosamente ao sabor desta brisa amena e inebriante.
Gosto desta monotonia... E mesmo que um dia volte a procurar-me nos sítios onde não estou, mesmo que continue a imaginar me de uma forma que não sou, agora estou aqui. Não me sinto errante, não me sinto perdida. Sinto-me.
Sinto invadir-me uma serenidade quente e reconfortante. Sorrio. Finalmente sei. O segredo que julgava estar guardado para lá das portas do universo, inatingível ao entendimento humano, carrego-o comigo. O segredo está em mim. O segredo não está nas minhas escolhas, certas ou erradas, o segredo está no meu livre arbítrio, no poder que tenho de escolher. Agora sinto-me livre, dona de mim, do meu tempo, senhora do meu mundo, agora sou apenas aquela que me penso. Gosto deste silêncio.
E finalmente... o silêncio é apenas silêncio.
12 de Maio de 2009

segunda-feira, 11 de maio de 2009

De mim nada restará.

Tenho minh'alma num desassossego e desvario...
Nada poderei dar-te e de ti nada quero.
Quero apenas a tua presença em mim
e a firme certeza de que existes.
De mim nada restará
porque tuas mãos das minhas se soltaram
e de teu olhar acabei por me perder.
Nesta certeza das incertezas
O eterno cansaço de querer.
Trago em minh'alma a cega dor
de tudo sentir e não saber que sinto.
Sou como folha caída arrastada pelo vento
E já não sei porque minto
Porque nego tamanho desvelo.
Como os laços que prendem são efémeros
De maior brevidade que a vida...
De mim nada restará
e nesta escuridão que cega
apenas ouço os teus passos que se aproximam.
Mas não te sinto chegar...
De mim nada restará e engano o mundo...
O engenhoso engano de que tudo passa
Como água que corre no rio
E por mais que tente nada há que eu faça.
De mim nada restará
a não ser a memória,imperfeita e desfocada,
de um momento perfeito... ou imaginado?
Como pó que se levanta no caminho por onde passo
De mim nada restará...Nada mais poderei ser
porque em meu ser tudo está terminado.
Minh' alma morreu em corpo vivo
E, da luz, clara e ofuscante,
Apenas sombras ficaram.
28 de Abril de 2009