domingo, 27 de dezembro de 2009

A propósito do medo.





O medo é cobarde. Chega quando todos saem, aninha-se no peito e bebe-nos o sangue qual sanguessuga.



O medo tem medo das gentes. E, por isso, espera horas tardias de solidão para nos entrar pelas janelas abertas da alma. O medo tem medo do medo. E foge, o cobarde, quando outros chegam.

domingo, 13 de dezembro de 2009

O tempo não tem tempo.




A palavra tempo sempre despertou em mim sentimentos contraditórios. Nunca o entendi muito bem: afinal quanto tempo tem o tempo, quanto tempo nos dá o tempo?


Recomecei a usar relógio de pulso apenas de há uns anos para cá... Tudo porque, de cada vez que o usava, sentia que ele teimava em apressar-me para algo que não queria que chegasse, evaporava minutos que queria viver para sempre ou, simplesmente, não avançava para algum momento que ansiava que acontecesse. Daí até se tornar um vício olhar para os três ponteiros no mostrador, foi um passo. Passava a vida, suspensa na ansiedade, de olhos postos no pulso, observando cada deslizar cadenciado até que, a muito custo, consegui manter com aquele engano engenhoso uma relação mais saudável.

Nas minhas certas incertezas sei, agora, que o tempo é eterno e se move em círculos. Traz, leva e, muitas vezes, devolve aquilo que arranca de nós à socapa, qual caçador furtivo à espera da melhor oportunidade para apanhar a presa desprevenida.

Aprendi a apreciar os instantes que antecedem algo que eu quero muito que chegue... o batimento cardíaco acelerado, a garganta seca e a cabeça produzindo mil imagens que de tão desejadas se tornam reais. Consigo, agora, aproveitar a brevidade de momentos em que um olhar indiscreto e inquieto diz tudo, sem angustiar-me com o inevitável fim. O olhar, esse, guardo-o na escassa eternidade de que me faço e, por isso, sobrevive ao avançar galopante do tempo. Diz-se do momento ser o mais breve período em que o tempo pode dividir-se. Eu digo, esse momento poderá ser o mais duradouro de todos, dentro da sua curta duração. Já não penso nas noites que comem os dias impiedosamente, porque os risos e sorrisos, os olhares cúmplices sobrepõem-se à triste ideia de finito. E isso chega para que tudo se sustenha. Embrulho cada pedacinho de cada momento em papel colorido, porque um dia estaremos demasiado velhos para dizer piadas sem sentido e viveremos de memórias. Redescobriremos, então, cada um deles no pó de tempos passados, mas que permanecem tão presentes agora como naquele lapso de tempo. Neste tempo não há tempo. Neste tempo, ausente de si mesmo, deixo apenas que os meus sentidos naufraguem em instantes que carregarei comigo, eternamente.



Acho que voltarei a esquecer-me de usar relógio...

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Eis que volto ao silêncio. Recorrente. (Des)Conforto...




Nada te direi, pois então. Que as palavras estão gastas e pouco sentido fazem. Nada direi. Deixarei que cada palavra morra em mim e se transforme em ar comprimido de encontro ao peito. Nada direi e com isto digo tudo.


Mas sinto...

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Quando tudo está além das palavras.




 Sinto permanentemente essa necessidade. Mas talvez seja impossível encontrar outras formas de o fazer. Queria escrever. Queria deixar escorrer pelos dedos palavras que traduzissem este muito, este tanto. Depois apercebebo-me qua as palavras são pouco perante o que me trepa no peito e se aloja algures entre o coração e a alma. Essas palavras não são nada. Estão gastas, amarelecidas pelo tanto que as repito. As palavras são as mesmas. E eu nasço outra sempre que o que sinto me sufoca os sentidos. Nasço em mim como cada onda que se insurge do âmago do oceano.



Saber que te tenho é sentir que regresso a casa.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Eu.


Eu tinha tudo.


Eu tinha os meus livros.

Eu tinha as minhas canetas de todas as cores.

Eu tinha os vestidos mais bonitos.

Eu tinha os meus brinquedos. Muitos. Imensos. Demasiados.

Eu tinha sempre um sorriso alegre e despreocupado.

Eu tinha tudo.

Eu era infeliz.

 
 
 
 
 
E cada sorriso meu era um grito.